Em decisão inovadora, a Justiça gaúcha deferiu o pedido de retificação de registro civil de pessoa não-binária residente da capi – Foto: Sandrine Monte Knopp – Ascom DPE/RS
POR CAMILA SCHÄFER – ASCOM DPE/RS
Porto Alegre (RS) – Em decisão inovadora, a Justiça gaúcha deferiu o pedido de retificação de registro civil de pessoa não-binária residente da capital. A ação foi ajuizada pelo Centro de Referência em Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (CRDH – DPE/RS) e incluiu, além da retificação do prenome, também a alteração da anotação referente ao sexo, passando a constar como “não-binário”.
Em sua decisão, o juiz da Vara dos Registros Públicos da Comarca de Porto Alegre afirmou que o Poder Judiciário deve frear eventuais discriminações das classes minoritárias, garantindo a todos o exercício pleno de uma vida digna. “Não permitir a autonomia da pessoa é torná-la inferior, pois o Direito e a Justiça não podem permanecer neutras em relação às concepções divergentes da chamada normalidade praticada em ideais morais e religiosos. Impossibilitar os indivíduos de serem o que sentem que são é uma afronta à Constituição. Não é uma opção ou escolha”, fundamentou o magistrado.
Até o momento, decisões desse tipo haviam sido noticiadas apenas nos estados do Rio de Janeiro, Santa Catarina e Piauí.
Segundo a coordenadora do CRDH, defensora pública Aline Palermo Guimarães, o direito à identidade é direito humano fundamental e parte essencial da personalidade, motivo pelo qual assegurar a sua efetivação é medida imprescindível para que se cumpram os ditames da Constituição Federal.
Retificação administrativa de registro civil de pessoas trans
Em 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4275, proferiu importante decisão para a proteção dos direitos das pessoas trans, tornando possível a adequação do prenome e do gênero no registro de nascimento de forma administrativa, ou seja, sem a necessidade de ação judicial. O tema foi regulamentado pelo Provimento nº 73 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Tal decisão, entretanto, não vem sendo estendida às pessoas não-binárias, motivo pelo qual o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos da Defensoria (NUDDH), ainda em agosto, encaminhou ofício à Corregedoria-Geral de Justiça (CGJ), solicitando a análise quanto à viabilidade de aplicação do provimento também a tais casos. O objetivo é evitar a judicialização e garantir que a retificação de registros civis de pessoas não-binárias possa ser feita de maneira administrativa, como já ocorre para pessoas trans binárias.
Sexo, gênero e não-binariedade
Historicamente, gênero vem sendo compreendido como uma característica ligada necessariamente a um determinado sexo. No entanto, sexo seria o aspecto estritamente biológico aferido no momento do nascimento; enquanto gênero, a construção cultural comumente vinculada a um determinado sexo.
A pessoa transexual, deste modo, é aquela que não traz em si esta determinação de seu gênero como consequência direta de seu sexo. Ou seja, ela não se identifica psicológica e socialmente com o sexo que lhe foi atribuído no seu nascimento.
Pessoas não-binárias, por sua vez, são pessoas transexuais que não se identificam com o sistema binário, ou seja, não se reconhecem como homens ou mulheres. A expressão da não-binariedade pode ser diferente para cada indivíduo.
Como procurar ajuda para a retificação de registro civil
O NUDDH publicou uma cartilha explicando alguns direitos da pessoa trans e trazendo informações básicas sobre como alterar prenome e gênero na documentação civil. Clique aqui para acessar a publicação.
Para orientações jurídicas, o Centro de Referência em Direitos Humanos (CRDH), unidade da Defensoria Pública, atua na construção de estratégias para enfrentamento e superação da discriminação e afirmação dos direitos humanos. O Disque Acolhimento é gratuito: 0800.644.5556 ou crdh@defensoria.rs.def.br.