Após três dias de júri, Alexandra Salete Dougokenski, 35 anos, foi condenada a 30 anos e dois meses de prisão pelos crimes de homicídio doloso qualificado, ocultação de cadáver e falsidade ideológica; e a seis meses de detenção pelo crime de fraude processual. Ela foi considerada culpada pela morte do próprio filho, Rafael Winques, 11 anos, em maio de 2020 na cidade de Planalto. A decisão foi proferida pela juíza Marilene Parizotto Campagna por volta das 23h35min desta quarta-feira (18), no salão do júri do Fórum de Planalto, região norte do Estado.
Na condenação de Alexandra, o crime de homicídio possui quatro qualificadoras, todas reconhecidas pelos jurados: motivo torpe, motivo fútil, asfixia, dissimulação e recurso que dificultou a defesa. Ela seguirá recolhida na casa prisional onde estava: a Penitenciária Feminina Madre Pelletier, em Porto Alegre. Os 968 dias em que Alexandra esteve presa preventivamente serão deduzidos do total da pena.
A acusação ficou por conta dos promotores do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MPRS), Michele Dumke Kufner, Diogo Gomes Taborda e Marcelo Tubino Vieira. A ré foi defendida pelo advogado Jean Severo e equipe.
Penas
- Homicídio doloso qualificado: 28 anos de prisão
- Ocultação de cadáver: 1 ano e 2 meses de prisão e 10 dias multa
- Falsidade ideológica: 1 ano de prisão e 10 dias multa
- Fraude processual: 6 meses de detenção e 10 dias multa
- Total: 30 anos e dois meses de prisão, 6 meses de detenção, e 30 dias multa no valor de 1/30 do salário mínimo na data do fato
Depoimento
No decorrer do processo, Alexandra apresentou cinco versões para o assassinato. Entre elas, a de que Rafael teria fugido, que o homicídio teria sido acidental, que teria agido por impulso e que o pai da vítima teria, junto de um comparsa, matado o menino.
Em seu depoimento no júri nesta quarta-feira, a ré negou a autoria do crime e sustentou que Rafael foi assassinado pelo pai, Rodrigo Winques, numa tentativa de levar o menino para morar com ele. Ela também acusou Rodrigo de ter tramado a morte dela no presídio.
As qualificadoras do crime de homicídio
O crime de falsidade ideológica foi imputado pelo MPRS à Alexandra por ela ter inserido declaração falsa em documento público. Ao registrar boletim de ocorrência, Alexandra teria mentido à polícia dizendo que acordou e percebeu que Rafael não estava, que a cama estava desarrumada e que não sabia o que poderia ter “o motivado a sair de casa sem avisar ninguém”. Disse, ainda, que Rafael levou duzentos reais em espécie. Conforme o MPRS, Alexandra já sabia que Rafael estava morto.
A fraude processual, outro crime pelo qual foi denunciada, decorre do fato de Alexandra ter forjado uma marcação no calendário de casa. Ela circulou a data 14 de maio de 2020 e depois mandou mensagem à polícia afirmando que havia encontrado um calendário com uma marcação no último dia em que Rafael teria sido visto com vida.
Para o MPRS, Alexandra quis reforçar a falsa versão do desaparecimento, enganar a polícia, atrapalhar as investigações e afastar eventuais suspeitas que pudessem recair sobre si, tentando fazer com que a polícia acreditasse que Rafael havia fugido.
- Motivo torpe: Alexandra teria cometido o crime por motivo torpe para atender sentimento de dominação e satisfação de controle sobre terceiros, sobretudo pessoas mais frágeis, como era a vítima.
- Motivo fútil: Conforme a acusação, a qualificadora por motivo fútil decorre de Alexandra sentir-se incomodada por Rafael estar desobedecendo-a de forma reiterada e jogando online no celular em horário não permitido por ela. Nessas partidas, ele gritava e falava alto.
- Asfixia: Alexandra concretizou o crime mediante asfixia utilizando uma corda para estrangular o filho. Em um dos depoimentos, disse que teria utilizado a corda para arrastar o cadáver.
- Dissimulação e recurso que dificultou a defesa da vítima: A mãe fez com que o filho ingerisse o medicamento Diazepam sob o falso pretexto de que o auxiliaria a dormir melhor, tendo a criança tomado a medicação sem saber do intento homicida. Após algum tempo, Alexandra entrou no quarto silenciosamente e sem que fosse percebida. Nas mãos, levava uma corda que seria utilizada para estrangulá-lo enquanto estava desacordado, impossibilitando-o de qualquer reação defensiva, tanto pela diminuição da resistência ocasionada pela ingestão medicamentosa como pelo modo que agiu.
Motivação e crime
Conforme os promotores, nos dias que antecederam o homicídio, a ré passou a se sentir paulatinamente incomodada com as negativas do filho em acatar suas ordens, como diminuir o uso do celular e das horas de jogos online. Ela acreditava que a desobediência colocaria à prova o domínio que precisava ter sobre os filhos. De acordo com a denúncia, temia, ainda, que esse comportamento do caçula pudesse incentivar o filho mais velho, a partir do qual recebia pensão, a desobedecê-la. Foi este contexto que levou Alexandra a articular a morte de Rafael.
Para levar o plano adiante, retirou da casa de sua mãe comprimidos do medicamento Diazepam e os deixou guardados até o momento oportuno para utilizá-los. Decidiu matar o filho na noite anterior ao crime, após perceber nova desobediência de Rafael e repreendê-lo, aos gritos, para que parasse de jogar.
As investigações apontaram que, momentos antes de cometer o crime, ela tinha realizado pesquisas na internet sobre uso de substâncias tóxicas para diminuir a resistência das vítimas, como “Boa Noite Cinderela” e colírios, e assistido a filmes em que o prazer sexual é alcançado por violência, asfixia e uso de máscaras.
Entre as 23h do dia 14 de maio de 2020 e a 00h30min do dia 15 de maio de 2020, Alexandra fez com que Rafael tomasse dois comprimidos de Diazepam. A ingestão foi comprovada por laudos periciais. A denunciada esperou em seu quarto até que o medicamento fizesse efeito. Horas depois, ainda na madrugada de 15 de maio, verificando que a resistência da criança estava reduzida em razão do medicamento, e munida de uma corda, estrangulou o filho até que sufocasse.
– Após constatar que Rafael estava morto, Alexandra engendrou uma forma de ocultar o cadáver e despistar as suspeitas que pudessem recair sobre si. Para tanto, vestiu o corpo do filho, pegou seus chinelos, os óculos e decidiu levá-lo até a casa vizinha, onde sabia que existia um local propício à ocultação. A mãe sabia que no local havia um tapume que encobriria o corpo. Ao deparar com uma caixa de papelão, depositou o corpo, configurando a ocultação de cadáver com três agravantes: para assegurar a impunidade do crime de homicídio, crime contra criança e contra descendentes – afirmou a promotora MIchele Kufner.
Entenda o caso
Em 15 de maio de 2020, estudante do Ensino Fundamental, Rafael Mateus Winques, de 11 anos, desapareceu da residência onde morava em Planalto. Uma mobilização envolvendo familiares, amigos e vizinhos do menino, além da polícia e de cães farejadores, teve início no município.
A mãe do Rafael, Alexandra, sustentava que ele havia ido dormir e, na manhã seguinte, não o teria encontrado mais. Em aparições em veículos de comunicação, ela pedia por notícias do menino. Dez dias depois, Alexandra confessou que havia assassinado o filho e indicou a localização do corpo, que estava dentro de uma caixa de papelão no terreno da casa vizinha.
Fonte: Portal BEI